quinta-feira, 17 de novembro de 2011

FRANCA DO PARALELEPÍPEDO

- Pa-ra-le-le-pí-pe-do! 
- Pa-apai! Que língua é essa? É a língua do “p”?
- Não, filhinha. Paralelepípedo é... Bem! Pra simplificar: é um tipo de bloco de pedra que era usado pra pavimentar as ruas da cidade, há muito tempo.
- Pai! Pavimentar?
- No lugar do asfalto, filha. 
- Acho que entendi. Mas, era bloco grande? 
- Não muito, filha. Era mais ou menos da largura e cumprimento de um tijolo, mas um pouco mais alto, que era pra fincar firme no chão. Colocavam tudo em paralelo, ou seja, um ao lado do outro, até preencher todo o espaço onde passavam automóveis e... as carroças.
- Carroças, pai? 
- Puxadas por cavalos, guiadas pelos carroceiros, filha. Tinham trânsito livre por entre os carros e eram usadas, naquele tempo, assim como os táxis, moto-táxis ou entregadores de hoje, fazendo carreto, frete, entrega.
- Não demorava muito, pai? E se o cavalo empacasse?
- Bem, filha! Andavam no ritmo da cidade. Ninguém reclamava.
- Tinha ponto de carroça?
- Sim. Os carroceiros ficavam uns, ali nos fundos da Praça da Matriz, perto da Farmácia Normal; outros, no Largo da Misericórdia, perto da Santa Casa e do Hotel Francano, à sombra das palmeiras imperiais; outros, na Praça da Estação, em frente à Mogiana; outros, ainda, no Mercado Municipal, entre outros locais. Mas, um que ficou na saudade foi aquele no final da Avenida Major Nicácio, na beira do antigo buracão. Onde hoje faz fundos com a Escola Torquato Caleiro...
- Ah! Tem até um bebedouro até hoje, né, pai!
- Tem, mas ficava na calçada. Era onde os cavalos bebiam água. Agora o colocaram no canteiro central da avenida, tombado pelo Patrimônio Histórico, pras gerações futuras lembrarem-se da importância dessa época da nossa cidade...
- Então era importante, pai? 
- Era filha. Assim como os paralelepípedos também marcaram uma fase importante no sistema de urbanização da cidade. Ruas sem poeira, cidade ficou mais limpa, com menos doenças respiratórias, sem solavancos das bacadas e, afinal, ruas mais bonitas.
- Mas, pai, os cavalos faziam cocô na rua limpa? Isso não sujava?
- Essa é outra história, filha. Tinha os catadores de esterco, principalmente mulheres e crianças, que passavam pegando o cocô dos animais e levavam para adubar os seus quintais e até alguns que vendiam... Os quintais eram cheios de árvores frutíferas, robustas!
- Como?
- Cavalo come capim, então, o seu cocô é totalmente vegetal acrescido dos ingredientes resultantes da digestão animal. Um esterco riquíssimo! Pergunte pro Seu Nelson Queiroz, Dona Juraci Sartori e todo o pessoal da “agricultura orgânica”.
- Pai! E os pelepidos...
- Paralelepípedos, filha!
- Isso aí! Não existe mais?
- Bem! Até uns 30 ou 40 anos passados, todo o centro da cidade e a Estação eram pavimentados com paralelepípedos. Era charmoso, mas dava trabalho pra manutenção. Os derradeiros estavam ali na General Telles e Voluntários da Franca. Agora passaram asfalto por cima. O Centro virou calçadão, com petit pave. Novas tecnologias...
- Ah! Pa-apai! Mas eu quero ver os pelepidos!
- Não tem mais jeito, filha. Agora tudo está submerso pelo recapeamento...
- Então me dá um pililito-que-bate-bate!
- Só se você pronunciar pa-ra-le-le-pí-pe-do!












Beto Chagas é escritor e psicólogo, 
autor do livro de crônicas Palavras Contidas





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